A tarde do dia 21 de agosto de 1989 foi, para mim, inesquecível. Depois de algum “namoro” e resistências quebradas, como a velada oposição paterna e a falta de habilitação profissional para atuar na área, estreava no Jornalismo. E melhor, pelo Esporte. Oportunidade única para um jovem de 19 anos juntar duas de suas paixões – havia uma terceira, Carla Alessandra, amor de juventude e outro sonho a ser concretizado.
Graças ao incentivo e aval de meu tio Isaac Benarrós, decano do Jornalismo Amazonense, pude superar as barreiras e conhecer um mundo que já sentia em minhas veias e pulsando no meu coração: Redação de Jornal!
Com sentimento de realização pessoal e com vontade de superar os desafios, me apresentei na sede do jornal Diário do Amazonas naquela segunda-feira, dia 21 de agosto. Seria submetido a um teste, para constatar se eu “levava jeito”. Um rápido treinamento com o Editor de Esportes, o saudoso Reinaldo Silva e rua, pauta. Esse era o script...
Mas as coisas não aconteceram assim. O “treinamento” (na verdade acredito que seriam algumas dicas básicas) não foi possível e, para que eu não perdesse a viagem, meu primeiro dia de Redação foi como copdesck, uma função que acredito nem existir mais.
Meu primeiro dia de trabalho foi ficar na sala de telex, um cubículo de 1,5 por 4 metros, corrigindo as matérias que chegavam num ritmo frenético, nos papéis branco-amarelados, com faixas azuis laterais em ambos os lados. Tudo escrito em caixa alta.
Minha missão era sublinhar as palavras ou termos que deveriam começar com letra maiúscula, colocar os acentos (til, agudo, circunflexo, crase, trema...) e cedilhas devidos e, quando necessário, indicar quebra de parágrafo.
Um trabalho maçante e entediante, exceto por um porém: saber de todas as notícias em primeira mão, numa época em que a internet ainda engatinhava. A máquina de telex tinha uma peculiaridade: um botão de cor diferenciada (azul) com um sino de símbolo, que servia para a comunicação entre os operadores ou a transmissão de uma notícia urgente.
E, para uma tarde que já era marcante, algo para mim inimaginável aconteceu. O sinal estridente do sino começou a tocar insistentemente – até então não sabia da existência desse sinal. Explicaram-me o que significava e fui verificar.
Sou capaz de me lembrar o texto integral até hoje, em pouco mais de uma linha de mensagem: “ACABA DE FALECER, EM SAO PAULO, AOS 44 ANOS, O CANTOR E COMPOSITOR BAIANO RAUL SEIXAS. MAIS INFORMACOES DURANTE O DIA”. Assim mesmo, tudo em caixa alta, sem acentos e cedilha.
De quinze em quinze minutos, o flash era repetido, com a insistência do sinal sonoro. Não dava para esquecer. Por mais absorto que ficasse no trabalho, o barulho da notícia urgente me lembrava, a todo instante: MORREU RAUL SEIXAS!!!
A minha tarde inesquecível tornou-se duplamente inesquecível, embora por motivos antagônicos. A alegria do sonho realizado contrastando com a angústia e a dor da perda do ídolo, justamente no mesmo dia.
Hoje, passados 20 anos, aqueles momentos continuam vivos na minha memória e na minha vida. E nos dias atuais tenho a felicidade de compartilhar esses momentos com minha filha Scarlett Syssi, adolescente e roqueira de 16 anos, e com Carla Alessandra, aquela paixão juvenil (lá, do primeiro parágrafo, lembra?!), minha esposa há 17 anos (fora o tempo de namoro e noivado) e grávida de 7 meses de um menino que se chamará Raul... Por decisão unânime de nós três, Teófilo, Carla Alessandra e Scarlett Syssi.
“Luar, é meu nome às avessas...” (Raul Seixas, em Lua Cheia)